domingo, 19 de dezembro de 2010

Ubik

Uma das poucas coisas que irei postar que não é de minha autoria.
Um trecho bonito pra caralho, apenas uma parágrafo em um livro que trata sobre realidades alternativas e temas parecidos de ficção científica. Um exemplo a ser seguido, visto que nasce de um tema que é alvo de preconceito pela maioria dos leitores que temos contato (estou olhando pra vocês, pessoas que só vêem valor em obras poéticas babacas que a literatura brasileira está atochada).

"Como sempre, quando a oportunidade surgia, Joe olhava perspicaz e longamente para a garota que, se ele tivesse conseguido, seria sua amante, ou melhor ainda, sua esposa. Não parecia possível que Wendy Wright tivesse nascido com o mesmo sangue e os mesmos orgãos internos das outras pessoas. Próximo a ela, ele se sentia um sujeito atarracado, oleoso, suado e inculto cujo estômago roncava e respirava ruidosamente. Perto dela, ele se tornava consciente dos mecanismos físicos que o mantinham vivo. Dentro dele, mecanismos, tubos, válvulas, compressores de gás e correias de ventilador tinham de funcionar barulhentos, numa tarefa perdida, um trabalho destinado ao fracasso. Ao ver o rosto dela, ele descobria que o seu próprio consistia uma máscara de mau gosto. A percepção do corpo dela fazia com que se sentisse como um brinquedo de corda de segunda. Todas as cores dela tinham um aspecto sutil, uma iluminação indireta. Os olhos, aquelas pedras verdes lapidadas, olhavam impassíveis para tudo. Ele nunca vira medo neles, nem aversão, nem desprezo. O que ela via, aceitava. Geralmente parecia calma. Mas, mais do que isso, ela lhe dava a impressão de ser durável, imperturbada e tranquila, não sujeita a desgastem fadiga ou doenças físicas e deterioração. Ela provavelmente tinha 25,26 anos, mas ele não conseguia imaginá-la com aparência mais jovem, e certamente nunca iria parecer mais velha. Tinha controle demais sobre si mesma e sobre a realidade externa para isso." pg. 68

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Nós, construtos

Tijolo, concreto, cobre e asfalto são só galhos, gravetos e folhas mais elaborados: a cidade é tão participante da paisagem quanto qualquer árvore, mesmo em seu asfalto que abafa o chão e fios que cortam o céu.
 
Não se pode perguntar pra um pássaro qual é a lógica de entrelaçar os galhos para fazer seus ninhos, mas pode-se estudar, perguntar e compreender exatamente como é a construção de um prédio. Os deles são feitos para o nascimento, reprodução e o amor. Os nossos são abrigos, alguns, claro, são calorosos e confortáveis, mas outros estalam no meio da noite, ouvem-se passos e presenças invisíveis hostis.

 
Estudamos nosso próprio funcionamento, catalogamos, classificamos, nomeamos - talvez todo o processo seja um placebo, mera distração para a vã esperança de um dia conhecermo-nos como conhecemos os pássaros.

 
Será o processo, no final de tudo,  nosso ninho ?