segunda-feira, 31 de março de 2014

Pêndulo

A vida balança pra frente e pra trás entre o tédio e a tristeza, como um pêndulo, o mais cruel dos relógios.

Eu nunca compreendi essa fase por completo. Eu pensava ter compreendido essa frase aos 16 anos, " você é linda" eu disse "me beije, esses são os últimos dias antes das responsabilidades". Nada aconteceu. 

Aos 21 eu aprendi, você não reconhece o verdadeiro significado do tédio e da dor até o serviço militar obrigatório.

Nada descreve melhor uma marcha de 12 km com uma mochila pesada do que as marcas cortadas nos ombros pelas alças de náilon.

Tudo caminhada por um mísero treino de tiro, quatro horas esperando minha vez (culpa das inspeções de segurança que são individuais e burocráticas) e depois mais quatro horas para o treinamento noturno (culpa do Sol que insiste em ficar no céu quase 12 horas por dia).

Oito horas cavando uma trincheira me deixaram a dúvida sobre qual é a pior coisa que já senti na vida: , quando o braço adormece no meio do trabalho, e a única coisa que você sente nele é dor, ou, efetivamente dormir na trincheira.

Acordava a cada uma hora pelo frio, na verdade, não tanto pelo frio, acordava com minhas mãos tremendo sozinhas e achava que alguma coisa estava acontecendo.

Nesse mesmo lugar, vivi alguns dos meus momentos mais poéticos.

Deitar na trincheira me deixava testemunhar a escuridão absoluta da floresta e do céu sem estrelas se fundirem em perfeita harmonia, tudo num silêncio que parecia cair como um véu sobre todas as coisas, assim que o sol sumia.

Todas as vezes que ia embora, podia me perder no azul do céu, se espalhando sem cercas ou fios limites nas docas onde eu pegava o barco de volta pra casa. Deixava pra trás a ilha onde os treinamentos aconteciam com um alívio infinito.

Um certo dia as nuvens estavam tão uniformes que, quando se alinharam com o sol, a iridescência que se formou resultou no que parecia um deserto no céu, as areias escorregavam como seda, se assentando em calmas dunas de areia branca. 

As vezes eu lembrava dela no barco, ensaiava planos e palavras, mas eu estava certo sobre os últimos dias. O lugar dela, na ilha, era estar do lado de fora: eu sabia demais, e ela não sabia de nada dali. Eu me achava velho demais para aquela coisa, planejava reviravoltas quando saísse.

Me formei, entrei para o serviço militar, muita gente foi fazer outras coisas. Voltei à ilha algumas vezes, mas colocaram postes e energia elétrica lá.